quarta-feira, 20 de maio de 2009

DESPEDIDA CRUA

Eu quis olhar pra trás
Mas minha visão foi embaçada e não consegui ver
Eu quis sentir um cheiro, mas como se uma alergia me atacasse
Minhas narinas foram travadas e assim não pude
No meio da neblina, eu procurei pelos olhos
As mãos já foram soltas
Os corpos afastados
Mas eu ainda me lembrava
E eles eram verdes.

Eu quis dizer que tanto faz
Quis pensar que tinha jeito
Tentei sonhar com algum futuro
Mas futuro eu sei, já não há.

Eu pensei me deixar levar pelas desculpas
E acreditar que se passou tempo demais pra desistir
Mas jeito já não tem
O amor já não vem
E eu não tive culpa ou não quis ter.

Os olhos são cinzentos e o verde se apagou
A graça foi embora e o que ficou foi o choro.
A decepção também se foi
No lugar, um espaço vazio, oco e sem nome.
É o que tenho agora e te ofereço
Esse espaço é seu
Vazio, oco e sem nome.

Pra alguém ainda mais oco
Pra alguém ainda mais vazio.

A despedida não é necessária
E as palavras cruas são esmagadas com um sopro
Então eu digo:
Vá em paz e vá com seu nome
Vá com a paz que foi roubada de mim e
seu nome limpo e claro às custas do meu, agora sujo por amor do seu.
Pela sua falta de coragem
Pela sua fome de aplausos.

Fique com as palmas e fique com o nome
Como já disse, os nomes não me importam e os aplausos sempre cansam
Já que são sempre tão vazios.
E eu fico.
Fico com a promessa de um amor que vem
Com a ousadia de sonhar com um futuro.

Fico sentada na estrada ouvindo seus aplausos
E às pessoas que gritaram o seu nome.
Aos poucos os aplausos terminam
Os gritos se abafam
E ao redor dos seus olhos eu só vejo esse espaço
Tão oco e tão vazio
Um cheiro de nada

A voz da mãe que não preenche o vácuo
A lembrança de alguém que quis ver mais
Ser mais
As lembranças também irão um dia

Eu me levanto da estrada e vou
No silencio do seu nome e carregando o meu cheio de escória
Mas uma escória tão cheia de dignidade e tão leve
Finalmente eu verei olhos que me vejam também.

Um comentário:

  1. Belo texto Cintia.
    trechos como: 'pela sua falta de coragem, pela sua fome de aplausos...' '...e vou, no silêncio do seu nome, e carregando o meu cheio de escória, mas uma escória tão cheia de dignidade e tão leve...' conforme eu fui lendo, me causaram uma espécie de frenesi inibido e angustiado. sei lá... hahahaha...
    mas um texto e tanto.

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