segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O SOM DO MEDO


Depois que o grande animal havia varrido cada canto,
Adormeceu com sono pesado.
Então ela, que há muito esperava saltou da gaveta que mal a acomodava.
Caminhou até a janela, a abriu sorrindo com o toque da brisa fresca da madrugada.

O céu não trouxe estrelas aquela noite, e nem o brilho da lua.
Mas ainda sim, ela sorriu.
Olhou a imensidão do infinito e imaginou se em algum lugar por trás daquele horizonte, haveria gente livre.

Enquanto o bicho dormia, ela retirou o pão já embolorado da sacola e comeu.
Chorou de prazer enquanto seu estômago era saciado e enquanto observava as nuvens que aos poucos se carregavam.
E as lagrimas corriam com tanta pressa e o som dos seus sentimentos invadia a cidade alta, chegando à parte mais baixa.

E de repente ele despertou.
E o grunhido iniciou, os gritos enchiam os corredores, ele sabia onde ela estava.
Ela correu para a gaveta onde achou encontrar refúgio.
Ele cada vez mais perto caminhava sobre as patas tão temidas, ensurdecendo com seu gemido estrondoso.
Ela chorou, mas não mais de prazer.
Era mais uma vez o medo arranhando a sua porta.


“Os dias que eu me vejo só
São dias que eu me encontro mais
E mesmo assim eu sei tão bem
existe alguém pra me libertar.”
Los Hermanos/ Condicional

terça-feira, 20 de outubro de 2009

À MINHA DIVINDADE

Se tem um coisa de que o ser humano sempre necessitou e continua necessitando é o desejo de servir a uma divindade. Especialmente se esta lhe oferece algo em troca de sua servidão.

Em séculos de evolução muitos nomes já foram exaltados, muitos altares levantados e sobre eles entregues o tudo ou o quase tudo de seus fiéis.

Neste século frio e nesta sociedade capitalista e individualista, um novo deus emerge com olhar gélido das profundezas de cada ser. O EU.
Nós somos os nossos próprios deuses, e eles, habitantes de nosso interior têm sede e fome. E trabalhamos pelo nosso prazer e a melhor oferta que damos é a satisfação pessoal. O nosso desejo é uma ordem.

E com essa vontade de crescer diante desses deuses nós pisoteamos e esmagamos o outro. Comercializando sentimentos, plastificando relações, orando para nós mesmos, justificando através de nossa adoração o mal que fazemos.

E em nosso nome, negamos à existência de um ser superior a nós. Porque tememos dar satisfação de nossas atitudes ao encontrá-Lo. Porque odiamos Sua concorrência.

E recitamos todas as noites: “Que seja feita a nossa vontade. Amém.”
E exploramos, humilhamos em ode à nossa divindade.


“Porque o Filho do homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos.” Marcos 10:45

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

SOU DELA

Ela estava no velho que andava no meio da rua ignorando a calçada.
Ela vinha sorrindo na boca sem destes de uma criança, na lágrima que não caiu no olhar da mãe.
Eu a vi sentada na praça enquanto todos corriam na direção contrária.

Ontem olhei para o céu carregado de nuvens escuras e a vi, me disseram que estava vendo demais, mas isso sempre foi fato.
Estava no mar que me disseram ser assustador. E o que não é?
Sempre que a vejo dizem que enlouqueci. E quem não enlouquece quando a vê?

No grupo de mulheres conversando na esquina, na garrafa de água que eu segurei.
Na música que ouvi com a TV ligada.
No animal que passou por mim e nem olhou.

Sempre que a vejo alguma coisa muda
Vira no avesso
Me arrebata e transtorna tanto quanto uma vertigem.
Eu era e já não sou
Senti e já mudei
Chorei, mas esqueci.

Espero que ela me acorde todas as manhãs com o nascer do sol
Que ela acalente os meus sonhos.
Espero enxergá-la enquanto for viva.
Porque quando eu não for, não me separarei mais
Serei dela, serei só ela...
Poesia enfim.

"..Porque você não pode voltar atrás no que vê. Você pode se recusar a ver, o tempo que quiser: até o fim de sua maldita vida, você pode recusar, sem necessidade de rever seus mitos ou movimentar-se de seu lugarzinho confortável. Mas a partir do momento em que você vê, mesmo involuntariamente, você está perdido: as coisas não voltarão a ser mais as mesmas e você próprio já não será o mesmo..."

(Clarice Lispector /A Paixão Segundo GH)

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

DO CÉU

O céu trocou de cor à meia noite
Transformou-se em áspero e escuro tom
Configurou estrelas em versos
Longitude em acesso e tudo para ela.
Jurou por amor transformar-se em tarde ensolarada
A um pedido que fosse, da menina
Que cândida e calada observava da janela
O caso que o céu lhe propunha.

E transtornada e taciturna
Fechou a veneziana e com força correu
Escondeu-se no fundo dos lençóis e tímida se atreveu
A imaginar que no outro dia
Se pentearia, pintaria.
Ele com certeza lá estaria, então a veria e entregaria
Do sol todo brilho, da nuvem todo o branco.

Enquanto isso o amante intocável permaneceu no alto
E escureceu
Emudeceu
Choveu.

sábado, 10 de outubro de 2009

PRA MAIS TARDE

Mais tarde quero vê-lo enquanto dorme
Pra saber que faz com o ar que te dei.
Quando as luzes apagarem e o vento se calar
Vou passar por lá observando
Como você vive sem o som dos meus murmúrios
Sem o ronco do meu medo.

Quando tudo for noite e breu
Viajo e sinto o tempo que deixei, o sonho que colhi
E que hoje carrego em busca de um peito que ao aceite
Que o leve a sério
Que adormeça neste mistério

Quero saber a quantas anda as mentiras que te devolvi
Já que eram demais e não couberam em minha caixa
Será que cuida delas? Ou as fez voar como antes?
Delas eu me lembro, brincando de corda e bambolê
Acenando pra mim com um gesto intrépido e seco.

Um momento chegará em que visitarei o seu sono
Espiarei dentro do corpo o que ficou ali além do que era meu
Do pouco que dei, o tudo que tinha.
Hoje já não sei em que terreno baldio abandonei o que senti
Em que palavras ásperas perdi o que roubei de você.

Mas quando for o tempo você se lembrará
Que todas as coisas que me deu foram contra a minha vontade
E o único bem que exigi, me foi negado
uma colher de paz e uma pitada do honesto.

Eu que nunca pedi muito
Só recebi o que não quis, o que não fazia diferença
E quando peso as flores de plástico me sinto ainda mais só
Cheia de coisas
E sem nenhuma palavra pra rir ou pra chorar
Sem nada que me ilumine e me diga que já é dia.



(um pouco de cor pra assustar a dor
Que pousou no meu braço ocupando o espaço
Que imaginei um dia ser seu)

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

LONGE

Eu peço a Ele que me salve disso tudo
Que com um sopro Ele invada, e rompa
E me arremesse pra fora.

Me permita navegar pra longe dessas mãos que só pedem
Desses olhos que nem piscam
E dessas bocas que maldizem.

Eu quero correr e só parar quando for distante
Das pessoas que não se importam
Que apenas querem, mentem e ferem.

Eu grito pra Ele e espero pelo dia
Que serei livre
Que serei sonho, que serei Sua
Quero dormir hoje e acordar no lugar chamado Longe

domingo, 4 de outubro de 2009

AI DE MIM QUE NÃO SOU ASSIM, ROMÂNTICA.

“É pensando nos homens que eu perdôo aos tigres as garras que dilaceram.”
Florbela Espanca

Acho que as pessoas que acompanham meu blog e não me conhecem muito bem, devem achar que sou uma pessoa frustrada, mal amada e meio revoltada com o sexo oposto ao meu. Rá.
Então vou assumir aqui, que eu sou quase tudo isso mesmo.

Outro dia, deixei o pessoal da vã meio escandalizado quando disse que meu sonho era ser romântica. Romântica do tipo que chora de solidão, que se emociona com flores e que sempre acredita que tudo aquilo que a pessoa disse é a mais pura verdade.
Eu exagerei quando disse isso, eu não sonho em ser assim. Mas considerando que quase todas minhas amigas estão noivas ou chegando lá, pelo menos as que não estão, pensão em estar um dia. E eu continuo naquela mesmice toda, acredito que deve estar na hora de começar a acreditar nas pessoas. Poxa! Minha mãe já me falou 20 vezes que na minha idade, já esperava meu irmão nascer.

Não que eu me preocupe com o que pareço ser diante das pessoas, com um rótulo, eu me preocupo comigo. Com a minha falta de capacidade de sonhar, de achar que as coisas serão melhores, o problema em achar alguém que pelo menos, não me chame de anjo e não diga aquele turbilhão de frases feitas, sem sentido nenhum. Não ofendamos os anjos, eu não sou um deles. Mas a questão é que eu não procuro e ainda corro na direção contrária, quando vejo um casal no maior romance já penso logo: “O tempo passa, bem, não acredita nele não.”rs

Estou bem humorada hoje, porque rio dessa coisa toda que a sociedade coloca nas nossas costas como um peso, porque eu passo as noites de domingo no pc, mas as minhas notas são boas e eu sou uma bela tia viu.

O problema em questionar tudo, em não se deixar levar pela maré de mentiras que tenta nos arrastar todos os dias, é que a maioria das pessoas é levada por ela e você fica sentada sozinha, olhando.
Eu tento explicar que não preciso me fantasiar de bolo pra ser feliz, tento dizer que posso pagar as minhas contas. Tento fazer com que eles entendam que a coisa ta difícil e que gente de caráter você não encontra mais em qualquer esquina. Mas eles não entendem, não querem entender. Eles só cobram.

Fui bombardeada por mentiras, choro e drama. Eu to cantando a tal da “I’ll survive”, mas cantar é mais fácil que sobreviver de fato.

Quando você sair na rua, com o vento tocando o seu cabelo, feche os olhos e sinta. Sinta espalhadas no sopro suave o som de palavras, de promessas. Todas jogadas sem o menor interesse de serem mais que isso um dia.

Acho que vou continuar não chorando com a novela, vou continuar escrevendo pra vocês no domingo até que talvez os convença que o real é isso, ou até que eles me convençam e me façam sonhar com um anel e um buquê.

Nunca fui como todos
Nunca tive muitos amigos
Nunca fui favorita
Nunca fui o que meus pais queriam
Nunca tive alguém que amasse
Mas tive somente a mim
A minha absoluta verdade
Meu verdadeiro pensamento
O meu conforto nas horas de sofrimento
não vivo sozinha porque gosto
e sim porque aprendi a ser só...