quarta-feira, 14 de outubro de 2009

SOU DELA

Ela estava no velho que andava no meio da rua ignorando a calçada.
Ela vinha sorrindo na boca sem destes de uma criança, na lágrima que não caiu no olhar da mãe.
Eu a vi sentada na praça enquanto todos corriam na direção contrária.

Ontem olhei para o céu carregado de nuvens escuras e a vi, me disseram que estava vendo demais, mas isso sempre foi fato.
Estava no mar que me disseram ser assustador. E o que não é?
Sempre que a vejo dizem que enlouqueci. E quem não enlouquece quando a vê?

No grupo de mulheres conversando na esquina, na garrafa de água que eu segurei.
Na música que ouvi com a TV ligada.
No animal que passou por mim e nem olhou.

Sempre que a vejo alguma coisa muda
Vira no avesso
Me arrebata e transtorna tanto quanto uma vertigem.
Eu era e já não sou
Senti e já mudei
Chorei, mas esqueci.

Espero que ela me acorde todas as manhãs com o nascer do sol
Que ela acalente os meus sonhos.
Espero enxergá-la enquanto for viva.
Porque quando eu não for, não me separarei mais
Serei dela, serei só ela...
Poesia enfim.

"..Porque você não pode voltar atrás no que vê. Você pode se recusar a ver, o tempo que quiser: até o fim de sua maldita vida, você pode recusar, sem necessidade de rever seus mitos ou movimentar-se de seu lugarzinho confortável. Mas a partir do momento em que você vê, mesmo involuntariamente, você está perdido: as coisas não voltarão a ser mais as mesmas e você próprio já não será o mesmo..."

(Clarice Lispector /A Paixão Segundo GH)

4 comentários:

  1. Que digno! Um dos meus trechos favoritos. Como a gente anda sempre em sintonia, mesmo que silenciosamente, é um grande mistério. Que bom que você anda existindo, que é saber que antes de viver, nós existimos muito e fortemente. É bom respirar e saber que estamos tão vivos, não é? Mas o dia que vemos, ah, se vemos... nós nunca voltamos para o nosso tamanho original.

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  2. Título do post = título daquela música do Nando Reis que vc gosta. Rá!

    Um belo texto, como sempre :)
    Beijo Ci!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Cintia,

    Sabe,a morte está para a vida, e o amor está para a fome dos sonhos. São os paradoxos da vida, que também podem ser chamados de poesia. Lembro de uma citação de Leminsk que ele dizia "aquele que quiser mudar o mundo, que faça poesia".
    E é estranho falar em mudanças, eu achei que já tinha sentido a maioria das emoções e sensações descritas em livros e teorias. Descobri, que quando menos se espera a vida vem, pra te dizer que não sabe nada ainda, te trazendo uma nova sensação, algo que nunca imaginou sentir. Como qualquer mudança no começo assusta, mas depois que o seu entendimento se faz possível, se torna a sensação mais plena e doce que uma pessoa pode sentir. Nós seres-humanos limitados e pre-potentes,baseados em nossos livros, discos e filosofias, mal sabemos que a vida vai ser o nosso maior embasamento bibliográfico.

    Um grande texto Cintia e uma bela citação da Clarice.

    Beijos, saudade.

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